
A relatora especial da ONU para os direitos humanos nos territórios palestinos ocupados, Francesca Albanese, denunciou nesta quinta-feira (3) o que chamou de “economia de ocupação” de Israel — agora transformada, segundo ela, em “economia do genocídio”.
“Está claro que, para alguns, o genocídio é lucrativo”, afirmou Albanese em entrevista coletiva na sede europeia da ONU, em Genebra, após apresentar um relatório ao Conselho de Direitos Humanos detalhando o que classifica como “forças empresariais por trás da destruição da Palestina”.
Segundo ela, enquanto Israel devastava vidas e territórios palestinos nos últimos 21 meses, a Bolsa de Tel Aviv acumulou alta de 213%, com ganhos de mercado de 225,7 bilhões de dólares — sendo 67,8 bilhões apenas no último mês.
O relatório menciona 48 agentes empresariais — incluindo empresas-mãe, subsidiárias, franquias, licenciadas e parceiras — dos setores de armamentos, tecnologia, construção, energia e finanças. Essas corporações estariam fornecendo desde drones e caças F-35 até tecnologia de mira, usados, segundo a relatora, para lançar 85 mil toneladas de bombas sobre Gaza — o equivalente a seis vezes a carga lançada em Hiroshima.
A relatora também cita empresas de tecnologia que estabeleceram centros de dados e de pesquisa em Israel, utilizando dados palestinos em sistemas de Inteligência Artificial, o que ela descreveu como um “genocídio transmitido ao vivo”.
Albanese afirma que empresas internacionais e o próprio sistema jurídico global fracassaram em proteger os direitos do povo palestino e acusa diretamente essas corporações de estarem “profundamente ligadas ao sistema de ocupação, apartheid e genocídio”.
“A repressão do povo palestino por parte de Israel vem sendo apoiada por empresas que, mesmo cientes das violações dos direitos humanos, seguem indiferentes. Essas companhias reforçam a lógica colonial de expulsão e substituição dos palestinos. Isso não é acaso — é o funcionamento de uma economia projetada para dominar e apagar um povo inteiro”, denunciou.
Ela também destacou que até setores considerados neutros, como o turismo, o comércio e a educação, contribuem para a normalização da ocupação e do apagamento sistemático da vida palestina.
Segundo Albanese, o genocídio persiste “porque é lucrativo para muitos”.
A relatora pediu que os Estados-membros da ONU imponham um embargo total de armas a Israel, suspendam acordos comerciais e responsabilizem as empresas envolvidas por violações do direito internacional. “Empresas não podem alegar neutralidade: ou fazem parte da máquina de deslocamento, ou do seu desmantelamento.”
Durante a coletiva, Albanese foi questionada sobre o pedido dos Estados Unidos ao secretário-geral da ONU, António Guterres, para que ela seja retirada do cargo por “má conduta”. A diplomata italiana respondeu destacando o inédito apoio que recebeu durante a sessão do Conselho de Direitos Humanos: “Nunca vi tanto apoio a um mandato como vi hoje naquela sala. Podemos discordar, mas mereço respeito como relatora. Se algum Estado-membro tiver objeções, que dialogue com os colegas do Conselho.”
O número de palestinos mortos em Gaza já passa de 57 mil, segundo o Ministério da Saúde local, controlado pelo Hamas — dados considerados confiáveis pela ONU. A guerra provocou uma crise humanitária severa, deixando centenas de milhares de pessoas com fome.
O conflito teve início em 7 de outubro de 2023, quando militantes liderados pelo Hamas atacaram o sul de Israel, matando mais de 1.200 pessoas e fazendo cerca de 250 reféns.