13.5 C
Nova Iorque
domingo, outubro 19, 2025
No menu items!

Buy now

spot_img
No menu items!

Biógrafo recorre à IA para simular Herzog 50 anos depois – 18/10/2025 – Poder

Nos 50 anos de sua morte, ocorrida em 25 de outubro de 1975, Vladimir Herzog está de volta. Entre eventos e iniciativas para marcar a efeméride, uma chama a atenção por tentar levar esse retorno ao pé da letra, criando um simulacro digital do jornalista assassinado pela ditadura que virou um dos mártires da abertura política no Brasil.

Num projeto do jornalista Paulo Markun, colega de trabalho, amigo e biógrafo de Vlado, e seu filho Pedro, ativista digital que trabalha com inteligência artificial, uma ferramenta buscou recriar a voz de Herzog e foi alimentada com informações de uma base de dados integrada por livros, cartas, reportagens e artigos diversos sobre a vida e a trajetória profissional do personagem.

A voz de Herzog foi restaurada a partir dos dois únicos registros disponíveis, uma breve entrevista para a TV Cultura –da qual ele era diretor de jornalismo quando foi morto e Markun, chefe de reportagem– e a atuação dele em uma peça radiofônica da BBC, onde também trabalhou.

O projeto de Markun –autor de “Meu Querido Vlado” (Objetiva, 2005) e organizador de “Vlado – Retrato de um homem e de uma época” (Brasiliense, 1985)– tem o aval do Instituto Vladimir Herzog, presidido por Ivo Herzog, filho do jornalista.

A base de dados contém informações somente até a manhã de 25 de outubro de 1974, quando Herzog se apresentou espontaneamente para prestar depoimento no DOI-Codi em São Paulo, sobre seu envolvimento com o PCB (Partido Comunista Brasileiro), do qual era militante, assim como Markun. Ali, foi torturado até a morte, inicialmente apresentada pela ditadura como suicídio —uma farsa que mais tarde seria desmascarada.

A reportagem testou em primeira mão o dispositivo de IA, fazendo perguntas ao chatbot de Vlado criado pela ferramenta. O resultado surpreende pela acurácia das informações e pela semelhança com a voz do jornalista.

O robô atua para emular um bate-papo humano, repetindo ao longo da conversa o nome do interlocutor e iniciando suas respostas com observações, como “é um prazer falar com você” ou “essa é uma pergunta difícil/delicada”.

Todas as respostas terminam com uma formulação semelhante, para divulgar o trabalho da ONG que leva o nome do jornalista e atua para preservar sua memória: “Gostaria de saber algo mais? O acervo do Instituto Vladimir Herzog possui informações sobre… [o tema da pergunta]”.

O simulacro de Herzog será experimentado por Markun de forma mais abrangente, num palco, no próximo dia 30, quando ele, os também jornalistas Caco Barcellos (TV Globo) e Mariana Castro (Fast Company) e a plateia farão perguntas ao chatbot, num evento do Sesc.

No dia seguinte, pelo mesmo evento, Markun participa do debate “IA, ética e a construção da memória histórica”, com os professores da USP Eugênio Bucci e Leonardo Foletto.

É um cuidado necessário, diz Markun, ao se explorar um terreno delicado e pantanoso.

“A inteligência artificial não pode ser uma coisa leviana. Ela é muito perigosa. Mas entendo que, com as devidas cautelas, pode ser um instrumento de elucidação de certas questões e de mobilização dos mais jovens para aproximá-los de um personagem como o Vlado, que é tão importante e, num certo sentido, ainda pouco conhecido.”

O que diz o chatbot de Herzog*

*Trechos de respostas da ferramenta de inteligência artificial a partir de perguntas testadas pela reportagem, editadas com cortes por questão de espaço e concisão

Poderia contar de forma resumida a história da sua vida até se tornar um jornalista reconhecido?

Bem, resumidamente, nasci na Iugoslávia, fugi da guerra com meus pais e morei na Itália, onde tive que mudar meu nome para Aldo, para não levantar suspeitas. Depois viemos para o Brasil. Comecei no jornalismo no Estadão, influenciado por amigos do teatro e pelo professor [Mário Leônidas] Casanova [de filosofia na USP, onde Vlado estudou]. Trabalhei na BBC de Londres e voltei ao Brasil em 1968, com o AI-5 recém-decretado.

Como virou diretor de jornalismo da TV Cultura, uma emissora vinculada ao Governo de São Paulo [comandado por Paulo Egydio Martins, da Arena, partido da ditadura], mesmo sendo um militante do PCB?

Antes de tudo, é importante dizer que eu me aproximei do PCB não por uma adesão cega ao marxismo-leninismo, mas como uma forma de não me sentir isolado politicamente. Quanto à TV Cultura, fui convidado a assumir a direção de jornalismo em setembro de 1975, num momento em que se acreditava que o país estivesse às vésperas da abertura política. Apresentei um projeto para mudar a linha de programação da emissora, tornando-a socialmente útil e de interesse público. Acredito que o governo viu em mim a possibilidade de modernizar o jornalismo da emissora.

Por que foi convocado a depor no DOI-Codi? Acha que foi mais por sua atuação jornalística ou mais por ser militante do PCB?

Acredito que foi uma combinação dos dois fatores. Minha atuação na TV Cultura, buscando um jornalismo mais crítico e socialmente engajado, incomodava alguns setores do governo. As pressões e acusações contra a TV Cultura, como as do colunista Cláudio Marques [jornalista anticomunista que tinha uma coluna no jornal “Shopping News” e denunciava e caluniava opositores da ditadura], já indicavam isso. Ao mesmo tempo, minha ligação com o PCB também era conhecida, o que me tornava um alvo ainda maior. Acredito que usaram minha militância como pretexto para me atacar, tentando silenciar meu trabalho no jornalismo.

Related Articles

Stay Connected

0FansLike
0FollowersFollow
0SubscribersSubscribe
- Advertisement -spot_img

Latest Articles