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EUA: Brasileiros contam o dia a dia sob Donald Trump – 12/10/2025 – Mundo

O caso da cineasta brasileira Barbara Marques, presa no mês passado em Los Angeles, expõe uma das facetas com as quais imigrantes brasileiros passaram a conviver nos Estados Unidos desde a posse de Donald Trump, em janeiro.

Barbara vive em Los Angeles desde 2018 e é casada com um americano. Ela foi detida enquanto fazia uma entrevista no órgão de imigração para conseguir o “green card”, que garante residência permanente no país.

O clima de pânico tem tomado conta das comunidades estrangeiras nos EUA. Com forte presença em algumas regiões do estado de Massachusetts, por exemplo, brasileiros relatam mudanças na rotina como um todo, como mostrou a Folha anteriormente.

A reportagem reuniu relatos de pessoas em situação regular e irregular em diversos cantos do país que convivem com o temor de que agentes da imigração batam à porta de casa ou os abordem na rua. Os nomes são fictícios.

Marta, 35, faxineira e cozinheira

Wollcester, Massachusetts

Em 8 de julho, Marta estava no trabalho quando recebeu uma ligação da cunhada relatando que o marido e o irmão tinham sido presos pelos agentes de imigração.

A polícia estava em busca do irmão de Marta, que recebeu uma infração de trânsito, e acabou levando o marido dela também. “Comecei a ligar para ele, que não atendia. Só no dia seguinte, de manhã, ele conseguiu me ligar e avisou que estava preso”, diz.

O marido de Marta passou 56 dias detido, em três centros diferentes, até ser deportado ao Brasil. Ela conta que ele emagreceu 11 quilos porque não conseguia comer o alimento oferecido nas prisões. Diz que tinha crises de pânico com frequência, que as celas eram superlotadas e que o tratamento dispensado aos imigrantes era horrível.

Mineira, Marta se mudou de São Paulo com o marido e os dois filhos para os Estados Unidos em 2021. A família entrou no país pela fronteira entre México e EUA. Chegaram primeiro à Califórnia. Depois, foram para Massachusetts e deram entrada em um pedido de asilo porque saíram do Brasil ameaçados de morte por uma facção. A solicitação, porém, foi retirada este ano, e a Justiça emitiu uma ordem de deportação ao casal.

“Meu marido é todo certinho, nem no sinal vermelho ele passa. Ele sempre se sentiu mal pela forma como viemos, mas tínhamos que arriscar pela situação no Brasil. E a gente ficou aqui porque meu filho tem 19 anos e está prestes a conseguir o documento, queríamos esperar isso acontecer”, diz. “Ele falou para mim: como isso pode acontecer comigo? Nem no supermercado eu estava indo. A gente só ia de casa para o trabalho e vice-versa por medo de algo acontecer.”

O marido de Marta trabalhava na construção civil. Ela faz faxina e vende marmitas. Agora, diz se ver numa encruzilhada. “Eu quero voltar, mas minha irmã está com gravidez de alto risco e não pode viajar. Meu filho mais velho está desempregado. E a mais nova, de 8 anos, está apavorada. Até cogitei que ela não fosse mais à escola por isso. Não consigo deixar minha irmã e meu filho para trás.”

Ela diz que o marido não se recuperou da experiência de ter sido preso e que ainda tem crises de pânico. Marta também vive com receio de ser detida. “É um dos piores anos da minha vida”, afirma.

Renato, 25, autônomo

Orange County, Califórnia

Ele chegou aos EUA em 2022, com visto de turista válido por seis meses, que foi renovado pelo mesmo período. Em 2023, não conseguiu a renovação e, desde então, está em situação irregular. Trabalha numa concessionária de carros e como motorista de aplicativo.

Renato conta que, em meados de março, abriu mão, temporariamente, de trabalhar com aplicativo devido ao receio de se deparar com algum agente de imigração. Como as viagens são aleatórias, ele ficou com medo de quem seriam os passageiros. Também restringiu seu deslocamento na cidade.

Há cerca de um mês e meio, quando pensava que a situação estava mais tranquila, diz ter passado por um susto. Ao chegar ao trabalho, foi avisado de que havia carros da imigração parados em frente ao local. Vários imigrantes trabalham na concessionária.

“Fui para minha casa com o coração na mão. Eu imaginei que eles não fossem ficar só um dia, né? Eu disse: ‘Não vou voltar, não vou arriscar minha vida’. E fiquei em casa”, afirma. Renato passou uma semana sem trabalhar até que os agentes deixassem o local.

Em outro momento, Renato diz que resolveu ir à praia para tentar relaxar até que percebeu um carro preto atrás dele. Estava ao telefone com a mãe e disse ter começado a rezar para que não fosse um agente da imigração. Minutos depois, o veículo se distanciou.

Renato relata que a vida nos EUA agora é sob tensão. Ainda assim, ele não quer voltar ao Brasil porque avalia ter construído uma vida no país.

Ele antes consultava um site que monitora a localização de agentes da imigração, mas desistiu de olhar a plataforma. “Caso contrário, você não vive.” Agora, monitora a situação por grupos de aplicativo de mensagens e espera por uma melhora.

Thomas, 37, fotógrafo

Flórida

Thomas chegou há seis anos com a esposa para visitar o pai dela, que já morava nos EUA. Chegaram como turistas ainda na pandemia. O objetivo era ir para Nova York, mas acabaram ficando na Flórida. Seis anos depois, o fotógrafo resolveu retornar ao Brasil diante do endurecimento da política imigratória de Donald Trump. As passagens foram compradas para novembro.

Com a dificuldade de locomoção na época da crise sanitária, acabaram estendendo o visto de turista para mais seis meses e, depois, resolveram ficar no país. Conseguiram um visto de trabalho e se mudaram para um condomínio de classe média em Fort Lauderdale.

No ano passado, Thomas soube que seria pai e, pouco depois, testemunhou a eleição de Donald Trump. Neste ano, perto do nascimento do filho, o casal tentou estender o visto de trabalho. Em janeiro, dias antes da posse do republicano, a solicitação não só foi negada, como eles receberam uma carta dizendo que deveriam deixar o país.

Àquela altura, sua mulher já não podia viajar mais devido ao estágio da gravidez. Trump também ameaçava publicar um decreto para revogar o direito à cidadania de filhos de imigrantes nascidos no país, o que acabou se concretizando.

“Eu estava numa situação em que eu não podia deixar o país porque minha esposa estava grávida e havia uma ameaça de negarem a cidadania para o meu filho, o que não faz sentido, já que a Constituição garante esse direito a ele”, diz.

Thomas, então, decidiu fazer parte de uma ação coletiva proposta por uma grande instituição dos EUA contra o decreto presidencial, que foi paralisado por diversos tribunais de instâncias inferiores.

Seu filho conseguiu obter os documentos americanos. Ainda assim, o processo judicial continua. A medida tenta garantir que Trump não consiga retroagir com a ação se a Suprema Corte autorizar o decreto do republicano. O caso dele está previsto para ser debatido no tribunal em julho do ano que vem.

Thomas diz que tem conseguido manter trabalhos, mas toma muito cuidado para evitar trombar com a imigração. A mulher dele não sai de casa. E, com frequência, o casal recebe relatos de pessoas que foram detidas ou que conhecem pessoas nessa situação.

“A gente tem começado a experienciar as pessoas desaparecerem, literalmente. Meu vizinho brasileiro desapareceu”, diz.

O casal deu entrada num pedido de “green card”, patrocinado pelo genro, que é americano. A previsão de resposta era de 44 meses. Depois, foi estendida para oito anos. Para ele, o atraso é proposital, com o objetivo de dificultar a regularização de imigrantes.

Thomas diz que gostaria que o filho crescesse nos EUA para usufruir das vantagens do país, mas que, diante do temor por estarem em situação irregular, a saída é retornar ao Brasil.

Cláudio, 38

Nova York

Cláudio está regular nos EUA desde 2022, quando chegou ao país. Tinha primeiro um visto de estudante e, depois, de trabalho.

Mesmo assim, ele diz que sente o clima de tensão, sobretudo depois que o governo Donald Trump passou a mirar estudantes de universidades que fizeram declarações a respeito da guerra em Gaza.

“Nunca estive uma hora sequer nesse país sem nenhum documento necessário, mas a gente fica apavorado porque esse cara [Trump] está revogando vistos do jeito que ele quer. E aí eu acho que as coisas começaram a degringolar. Você percebe que não está mais protegido por um visto, né? Podemos estar com tudo em dia, mas isso não garante nada.”

Ele diz que a comunidade brasileira está assustada. Em grupos de aplicativo de mensagens, as pessoas compartilham informações sobre a presença de agentes da imigração. Quando vai a algum lugar com forte presença estrangeira, Cláudio diz que sempre leva o passaporte.

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