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Gestão guiada por ideologia prejudica produtividade – 19/09/2025 – Deborah Bizarria

A polarização brasileira deixou de ser barulho de grupo de família e passou a orientar confiança, afinidade e julgamento nas relações. Nem o mercado de trabalho escapou. Quando identidades políticas entram na triagem de currículos e nas decisões de promoção, o custo não é só moral, é econômico: equipes perdem qualidade, decisões ficam enviesadas e produtividade não cresce.

Evidência concreta, com dados do Brasil entre 2002 e 2019: empregadores são cerca de 50% mais propensos a contratar copartidários do que seria esperado no mesmo mercado local. Dentro das empresas, quem é do partido do chefe recebe prêmios salariais e sobe mais rápido, enquanto filiados do outro campo enfrentam penalidades. Em números, comparando colegas na mesma firma e ano, o prêmio salarial para copartidários chega a 3,8% e, controlando a ocupação, permanece em 2,8%. Há penalidade média de 1,6% para quem é de partido diferente e vantagem clara nas promoções, tanto na passagem para funções administrativas quanto no salto a cargos de gestão. Esses achados são de “Politics at Work“, de Emanuele Colonnelli, Valdemar Pinho Neto e Edoardo Teso, na American Economic Review.

Como se chega a esse resultado: Os autores conectam RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), dados da Receita Federal e filiação partidária do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para medir o quanto empresários e trabalhadores se alinham politicamente no mercado formal. Medem esse encaixe com um índice de matching e comparam bilhões de pares trabalhador/dono dentro de mercados muito finos. Olham a dinâmica com um estudo de evento: quando o dono muda de partido, aumentam contratações e massa salarial do “novo partido” e caem as do anterior, algo difícil de atribuir só a redes pessoais. Dentro da firma, comparam colegas no mesmo ano e, quando necessário, na mesma função, de modo que prêmios e penalidades não se confundam com diferenças de cargo. Para isolar discriminação, fazem um experimento com empregadores reais: currículos quase idênticos recebem apenas sinais discretos de filiação e os copartidários são sistematicamente melhor avaliados.

Um ponto crucial da pesquisa é separar discriminação de clientelismo, o toma lá, dá cá com o poder público. Se esse fosse o motor, veríamos o alinhamento interno crescer quando o partido do dono vence a eleição local ou em setores mais dependentes de contratos públicos. Não é o que aparece. Do estudo de evento ao experimento com currículos, as evidências indicam que a preferência política do empregador pesa mais do que trocas de favores com autoridades na hora de contratar e promover.

Isso é eficiência, não só equidade. Os copartidários estão, em média, negativamente selecionados em escolaridade nos cargos de gestão e firmas com maior fração de alinhados crescem menos do que seus pares. Em um país que necessita de aumentos de produtividade, usar a urna como filtro de RH é escolher andar com o freio de mão puxado. E não vale chamar de “coesão cultural”. Se trabalhar para “o meu lado político” fosse um benefício valorizado pelo empregado, o salário deveria ser menor como compensação, como aliás, costuma ocorrer em organizações sem fins lucrativos no qual o alinhamento de propósito costuma compensar salários menores. Nessa evidência apresentada, o que se vê é o inverso, uma preferência do empregador que não está atrelada a resultados.

Esse quadro conversa com a literatura de polarização afetiva, quando o adversário vira “outro moral” e a identidade partidária contamina julgamentos muito além da política. A animosidade partidária, antes restrita a temas públicos, transborda para consumo, amizades e, como aqui, para decisões de equipe. É um desvio de percepção e de incentivos que corrói relações e resultados.

A saída passa por melhorias de processos. Triagens cegas a pistas partidárias, entrevistas estruturadas, critérios observáveis e auditorias regulares que confrontam promoção e salário com desempenho. Política tem lugar na urna e no debate, não deveria ser critério na folha de pagamento.


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