Javier Milei ensaiava com sua banda para a apresentação que fará na noite desta segunda-feira (6), quando seu principal candidato a deputado na província de Buenos Aires, José Luis Espert, finalmente desistiu de concorrer, após dias de especulação desde que vieram à tona provas de que ele recebeu US$ 200 mil (cerca de R$ 1 milhão) de Fred Machado, um suspeito de tráfico.
O caso poderia ter tido um desfecho ainda na sexta-feira (3), quando Espert foi até a residência presidencial de Olivos para entregar sua renúncia a Milei. O presidente, no entanto, pediu que ele continuasse na disputa eleitoral de 26 de outubro —até receber pesquisas internas encomendadas pelo partido apontando que A Liberdade Avança poderia perder por até 20 pontos caso o deputado seguisse concorrendo.
“O kirchnerismo montou uma operação, ele é especialista nisso, é algo típico do socialismo do século 21”, disse o presidente em uma entrevista no domingo (5), afirmando que não foi ele quem pediu que Espert deixasse a disputa. “Ele colocou os interesses nacionais, o modelo da liberdade, antes dos interesses pessoais.”
Nesta segunda, quando Milei vai subir ao palco do Movistar Arena para apresentar seu novo livro “A Construção do Milagre” e cantar com apoiadores, o escândalo de Espert continua dominando o noticiário político na Argentina.
O partido governista nomeou o deputado do PRO Diego Santilli, para encabeçar a lista de deputados na província, e busca alterar as cédulas eleitorais, que já foram impressas com o rosto de Espert.
Até as eleições passadas, as cédulas (ou “boletas”, como são chamadas na Argentina) eram separadas para cada partido: o eleitor escolhia seus candidatos, colocava a cédula do partido em um envelope e o depositava na urna. Uma mudança defendida pelo governo Milei implementou o sistema de cédula única, em que todos os candidatos aparecem em um mesmo papel e o eleitor marca a sua escolha.
A substituição das cédulas após a renúncia do candidato, como pede A Liberdade Avança, teria custo estimado de cerca de US$ 10 milhões (R$ 55 milhões) e hoje é mais provável que a Justiça não autorize a substituição. A oposição pede que, caso a troca seja efetuada, ela seja paga com recursos do partido de Milei.
O mileísmo também deverá desenhar uma nova estratégia para ter chances na província, após o desgaste dos últimos dias gerado pelo caso. Mesmo em outros pontos do país, que o presidente tem visitado em um giro pelo interior, Milei tem enfrentado opositores e cancelados atos públicos, como recentemente ocorreu na Terra do Fogo e em Santa Fé.
Espert, que também presidia a comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados, também renunciou a esse posto em uma carta enviada ao presidente da Casa, Martin Menem. O próprio Milei havia indicado a mudança na noite anterior, em entrevista ao La Nacion+, que admitiu que “o mais provável” era que ele fosse substituído por Alberto Benegas Lynch, também economista.
Duas iniciativas na Câmara pedem que o deputado perca seu mandato, uma delas apresentada pelo radical Facundo Manes. “Se Espert não pode ser candidato, ele também não pode ser deputado”, argumentou Manes em suas redes sociais. “Exigimos sua exclusão. A política não pode mais ser um terreno para a desonra”, disse ele.
A Justiça do Texas vai decidir se Fred Machado, empresário argentino do setor de aviação particular, está envolvido na parte logística de um esquema de tráfico de drogas.
Ele também tem participação em uma mineradora da Guatemala para a qual Espert disse ter prestados serviços de consultoria econômica, ao explicar o recebimento dos US$ 200 mil. Machado está em prisão domiciliar em Viedma (Río Negro), enquanto a Justiça dos EUA aguarda sua extradição.
O escândalo envolvendo o deputado de Milei ocorre dias antes das eleições legislativas nacionais, que funcionam como um teste de metade de mandato.
O governo tinha expectativa de aumentar sua força no Congresso. Com a economia em dificuldades e vindo de uma eleição legislativa muito ruim na província de Buenos Aires, em que ficou 13 pontos atrás do peronismo, o mileísmo chega fragilizado ao pleito de outubro.