O Senado e a Câmara dos Deputados aprovaram um projeto de lei que altera o momento em que é aferida a idade mínima de 21 anos para que um candidato assuma o mandato de deputado federal ou estadual. O projeto procura unificar a regra para todos os estados, mas também acaba beneficiando o filho do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL).
O texto foi enviado para sanção ou veto do presidente Lula (PT).
Atualmente, a lei eleitoral determina que a idade mínima é verificada na data da posse, o que para a Câmara dos Deputados é no dia 1º de fevereiro, quando ocorre também a eleição da Mesa Diretora.
O novo texto estabelece que o deputado eleito deve alcançar 21 anos num prazo de até 90 dias contados a partir da eleição da Mesa —o que na prática amplia o prazo de fevereiro para o fim de abril.
Álvaro Lins Pereira de Lira, filho de Arthur Lira e apontado como herdeiro político da família, completa 21 anos em 17 de março de 2027. Alvinho, como é conhecido, poderia então concorrer ao cargo de deputado e assumir o mandato caso eleito, de acordo com a nova regra.
Procurado pela reportagem, Lira não respondeu até a publicação desta reportagem.
A justificativa do projeto é de que, ao estabelecer esse mesmo prazo para todas as Assembleias e Câmara Federal, sem a possibilidade de alteração ou prorrogamento, não haverá espaço para que cada Casa Legislativa decida de maneira diferente a depender do caso e da conveniência política.
Nos bastidores, deputados próximos a Lira afirmam que a construção e aprovação do texto tem a influência direta do ex-presidente. Um deles chegou a brincar que a lei deveria se chamar “lei Alvinho”.
As alterações na verificação da idade mínima estão incluídas em um projeto de lei que também trata de panfletos eleitorais, determinando que parte deles deve ser disponibilizado em braile —prática conhecida com jabuti, jargão legislativo para definir um trecho em projeto de lei alheio ao tema principal.
O texto foi aprovado no Senado nesta quarta-feira (1º), quando foi enviado à Câmara, onde foi aprovado já no dia seguinte, nesta quinta-feira (2). O relator foi o líder do PP e aliado de Lira, deputado Dr. Luizinho (RJ).
O projeto foi protocolado no Senado em 2015 e tratava apenas dos panfletos em braile. A tramitação estava parada na Casa até a semana passada, quando o senador Eduardo Braga (MDB-AM) foi designado relator na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e acatou uma emenda, proposta pelos senadores Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) e Otto Alencar (PSD-BA), que acrescentou a parte sobre a idade mínima .
Atualmente, há brechas e precedentes de casos de deputados eleitos que assumiram sem ter alcançado a idade mínima na data da posse, mas o projeto aprovado, se sancionado, faz com que Álvaro não dependa de eventuais exceções ou manobras.
O regimento da Câmara dos Deputados, por exemplo, diz que a posse pode ocorrer num prazo de 30 dias, prorrogável por mais 30 dias, em caso de “motivo de força maior ou enfermidade”. Essa brecha, no entanto, varia conforme o regimento interno de cada Casa Legislativa e está sujeita a mudança conforme a vontade dos dirigentes e do plenário.
Em seu relatório, Luizinho argumenta que a medida tem o objetivo de uniformizar um prazo único para a aferição da idade no caso da Câmara e das Assembleias.
“Como se sabe, são eleitos muitos membros e as datas de posse estão sujeitas a uma série de normas de âmbito legislativo local, inclusive quando se trata de prorrogações. A proposta […], ao estabelecer critério único para constatação da idade mínima, independentemente da norma regimental de cada Casa —vedando inclusive reduções e prorrogações—, confere maior segurança jurídica ao sistema normativo eleitoral brasileiro, uma vez que afasta as particularidades e possíveis casuísmos locais”, diz o relator.
O texto aprovado diz que a idade mínima será aferida na data da “posse presumida”, ou seja, a posse “ocorrida dentro do prazo de até 90 dias contado da eleição da respectiva Mesa Diretora, independentemente da norma regimental de cada Casa, vedadas reduções ou prorrogações”.
Como mostrou a Folha, Álvaro foi nomeado para o cargo de gestor administrativo em Barra de São Miguel (AL) em fevereiro deste ano, com salário de R$ 8.000.
Avô de Álvaro e pai de Lira, Benedito de Lira, que morreu em janeiro deste ano, havia sido reeleito prefeito do município. Agora, o gestor é seu vice, Luiz Henrique Lima Alves Pinto (PP), que tem salário de R$ 12 mil. Durante a campanha, Álvaro foi ponto-chave ao preencher lacunas que o avô, à época com 82 anos, não conseguia.
Em Alagoas, Álvaro é visto como o sucessor natural do ex-presidente da Câmara dos Deputados. Embora seja o caçula, ele é o filho que escolheu participar das atividades políticas da família.