Em 21 de novembro de 1963, o historiador americano Richard Hofstadter foi recebido como palestrante na Universidade de Oxford, no Reino Unido. Era um professor conceituado da Universidade Columbia, em Nova York, onde fez sua formação. Título da palestra: “O Estilo Paranóico na Política Americana”.
O convidado discorreu sobre um fenômeno velho e recorrente, na sua visão, que tem a ver com expressões de descontentamento social. Não seria a primeira vez que Hofstadter recorreria à psicologia para interpretar processos históricos.
O dia seguinte confirmou o teor da palestra: John F. Kennedy, então presidente dos Estados Unidos, morria num atentado no Texas. O fato que abalou não só os EUA, mas o mundo, foi imediatamente embrulhado em camadas de versões. Havia um assassinato, sim, mas havia sobretudo um complô. Afinal, quem eliminou Kennedy? A Máfia? Agentes da CIA? Emissários cubanos? Óvnis? Como Hofstadter quis demonstrar em Oxford, uma ideia marginal pode se transformar em motivo-força para a construção de mensagens com eco, adesão e resiliência na sociedade.
A contribuição deste historiador reaparece no dossiê “A Nova Era da Conspiração”, publicado recentemente pela revista do MIT. É leitura recomendada para quem quiser entender um dos desafios contemporâneos. Em artigos temáticos, a revista retoma fontes clássicas, ao mesmo tempo em que ouve cientistas em atividade, confirmando que o conspiracionismo é um fenômeno longevo, porém, nunca foi tão fácil ser um dos seus adeptos como agora.
Talvez o primeiro pensador a falar em “teoria da conspiração” tenha sido o filósofo austro-britânico Karl Popper (1902-1994). Pode ter acontecido em 1948, numa conferência intitulada “Em direção a uma teoria racional da tradição”. Ali ele não tratou de indivíduos, mas de grupos.
Hofstadter seguiu Popper, fez seus discípulos, e hoje há inúmeros pesquisadores debruçados sobre o tema. Entre eles, Michael Barkun, professor emérito da Universidade de Siracusa, nos EUA, e autor de “A Cultura da Conspiração”. Seus achados traduzem muito bem a atualidade.
Segundo Barkun, a interpretação conspiracionista dos fatos parte de três pressupostos: 1. Tudo está conectado. 2. Tudo é premeditado. 3. Nada é o que parece.
Ele ainda separa em níveis o ímpeto conspirador: o que parte de um evento inesperado, como a Covid-19; o que se constrói pela repetição sistemática de algo infundado ou não comprovado, como os “planos secretos” do Fórum Econômico Mundial; e o que extrapola para uma fabulação sem limites, como alardear a existência de um grupo de pedófilos que controla o mundo. Embora analisados separadamente, estes três níveis se encaixam como bonecas russas.
A publicação do MIT evidencia como o conspiracionismo se articula a partir do pastiche entre a política e a tecnologia. Os exemplos são muitos. Numa postagem sobre o furacão Helena, que varreu o sudoeste americano em 2024, a congressista republicana Marjorie Taylor Greene, voz fervorosa do Maga, escreveu sob uma imagem de pura destruição: “Sim, agora eles podem controlar o tempo…”
Eles quem? Mentes satânicas que fabricam ciclones. A entidade pronominal da postagem serve para culpabilizar climatologistas que hoje lutam para mitigar os estragos das sucessivas tormentas. Mas os magaloides discordam. Não cabe na sua leitura de mundo.
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