O vice-presidente dos Estados Unidos, J. D. Vance, chegou a Israel nesta terça-feira (21), enquanto Washington tenta estabilizar a primeira fase do frágil cessar-fogo em Gaza e pressionar pelas concessões mais difíceis exigidas de cada lado nas próximas negociações.
Israel e o grupo terrorista Hamas se acusam mutuamente de repetidas violações da trégua desde que foi acordada há oito dias, com episódios de violência e críticas sobre o ritmo de devolução de corpos de reféns, entrada de ajuda e abertura de fronteiras.
O plano de cessar-fogo em 20 pontos de Donald Trump exigirá ainda etapas muito mais difíceis com as quais as partes ainda não se comprometeram totalmente, incluindo o desarmamento do Hamas e medidas em direção a um Estado palestino.
FOCO NA PASSAGEM PARA A SEGUNDA FASE DO CESSAR-FOGO
Vance deve se reunir com o primeiro-ministro israelense Binyamin Netanyahu. Eles conversarão sobre “os desafios de segurança que enfrentamos e as oportunidades diplomáticas que se apresentam”, segundo o premiê israelense.
A viagem ocorre após as conversas de segunda-feira (20) entre Netanyahu e os enviados americanos Steven Witkoff e Jared Kushner, genro de Trump, e coincide com reuniões do Hamas com mediadores no Cairo.
Um alto funcionário israelense disse que o objetivo da visita de Vance era avançar as negociações sobre Gaza para a segunda fase do cessar-fogo. Israel pressiona por garantias mais fortes sobre o desarmamento do Hamas.
As negociações envolvendo a facção palestina no Cairo, lideradas pelo dirigente exilado Khalil al-Hayya, também analisam as perspectivas da próxima fase da trégua e os arranjos pós-guerra em Gaza, além de buscar estabilizar o cessar-fogo existente.
O chefe da inteligência do Egito e considerado mediador-chave em Gaza, Hassan Mahmoud Rashad, reuniu-se com Netanyahu mais cedo nesta terça para discutir o avanço do plano de cessar-fogo e outras questões, informou Israel. Rashad deve se reunir mais tarde com Witkoff, segundo a mídia egípcia.
Evidenciando a fragilidade da trégua, o Qatar, outro mediador, acusou Israel nesta terça de “violações contínuas”. Qatar e Turquia —que tem usado seu papel para reforçar sua posição regional— têm sido interlocutores-chave junto ao Hamas.
QUAL SERÁ O PAPEL FUTURO DO HAMAS?
O plano de Trump prevê a criação de um comitê palestino tecnocrático supervisionado por um conselho internacional, sem que o Hamas tenha papel algum no governo.
Um funcionário palestino próximo às negociações disse que o Hamas apoiou a formação de tal comitê para administrar Gaza sem representantes seus, mas com o consentimento do grupo, da Autoridade Palestina e de outras facções.
Na semana passada, o alto dirigente do Hamas Mohammed Nazzal disse à Reuters que o grupo esperava manter um papel de segurança em Gaza durante um período de transição indefinido.
Na mesma semana, a facção entrou em confronto com gangues rivais nas ruas de Gaza e assassinou publicamente homens acusados de colaborar com Israel. O comando militar dos EUA no Oriente Médio pediu ao Hamas que encerrasse a violência imediatamente.
DEVOLUÇÃO DE CORPOS E ENTREGA DE AJUDA
Em entrevista à televisão egípcia na noite de segunda-feira, o dirigente Hayya reafirmou o compromisso do Hamas com a trégua e disse que cumpriria suas obrigações na primeira fase, incluindo a devolução de mais corpos de reféns.
“Que os corpos deles (reféns) retornem às suas famílias, e que os corpos de nossos mártires retornem às suas famílias para que sejam enterrados com dignidade”, afirmou.
Mais um corpo de refém sequestrado pelo Hamas nos ataques de 7 de outubro de 2023 —que desencadearam a guerra— foi devolvido na segunda-feira e identificado pelas autoridades israelenses. Cerca de 15 corpos ainda estariam em Gaza, e Israel espera que cinco deles sejam devolvidos em breve.
Israel devolveu nesta terça outros 15 corpos palestinos, informaram autoridades de saúde locais, elevando para 165 o total de cadáveres repatriados a Gaza.
Dentro do território palestino, mais ajuda estava chegando nesta terça por meio de duas passagens controladas por Israel, segundo autoridades palestinas e da ONU.
No entanto, com os moradores de Gaza enfrentando condições catastróficas, as agências humanitárias afirmam que é preciso muito mais.
O Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU afirmou que o fornecimento está aumentando, mas continua muito abaixo de sua meta diária de 2.000 toneladas, devido ao fato de apenas duas passagens estarem abertas. O órgão disse que nenhuma ajuda havia chegado ainda ao norte de Gaza, onde há relatos de fome generalizada.
A violência em Gaza desde a trégua tem se concentrado principalmente em torno da chamada “linha amarela”, que demarca a retirada militar israelense. Nesta terça, a rádio pública israelense Kan informou que tropas mataram uma pessoa que cruzou a demarcação e se aproximava dos militares.
Palestinos próximos à linha, que atravessa áreas devastadas perto das principais cidades, disseram que ela não está claramente demarcada, sendo difícil saber onde começa a zona de exclusão. Escavadeiras israelenses começaram a colocar blocos de concreto amarelos ao longo da rota na segunda-feira.
O ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, informou nesta terça que pelo menos sete palestinos foram mortos por disparos israelenses nas últimas 24 horas, elevando para 68.229 o número total de mortos desde o início da guerra.
Os ataques terroristas de 7 de outubro de 2023 mataram cerca de 1.200 pessoas, segundo registros israelenses, e outras 251 foram levadas como reféns para Gaza.