“Estamos no Afeganistão?”, questiona com indignação um pescador de Trinidad e Tobago, após a suposta morte de dois colegas em um ataque dos Estados Unidos contra uma embarcação nas águas do Caribe.
A comunidade de Las Cuevas, no norte do arquipélago, ficou em choque após receber informações de conhecidos na Venezuela que indicavam que duas pessoas da ilha estavam na embarcação atacada pelos EUA dois dias antes, na terça-feira (14).
A polícia de Trinidad e Tobago iniciou uma investigação.
Os Estados Unidos anunciaram em agosto uma operação contra o narcotráfico com navios de guerra em águas internacionais do Caribe, perto da Venezuela, pouco depois de acusar o ditador chavista Nicolás Maduro de liderar um cartel de drogas.
Caracas nega as acusações e fala em uma tentativa de mudança de regime. Pelo menos cinco embarcações foram bombardeadas desde então, com um saldo de 27 mortos, segundo Washington.
Seis pessoas morreram no último ataque, de acordo com o anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A AFP não pode verificar estes números de forma independente.
Várias pessoas de Las Cuevas afirmam ter sido avisadas de que Chad Joseph e Rishi Samaroo estavam a bordo da última embarcação atacada. “Estamos em Israel? Estamos no Afeganistão? Em algum desses lugares ou o quê? Estamos no Caribe, amigo. Aqui há paz e amor”, disse um pescador que recusou se identificar.
A situação é tensa em Las Cuevas, um vilarejo de pescadores com cerca de 150 casas, em meio a uma baía paradisíaca de águas cristalinas e vegetação selvagem, a cerca de uma hora da capital Port of Spain.
Familiares dos supostos mortos refutam as acusações de narcotráfico feitas por Washington. Lynette Burnley, tia de Chad Joseph, afirma que seu sobrinho era pescador desde criança e tinha uma personalidade “encantadora e simples”.
“Foi para a Venezuela e nunca voltou devido a problemas com o barco. Ele ajudava as pessoas, limpava terrenos, trabalhava a terra. Todo tipo de pequenos trabalhos para permitir que vivesse lá”, afirma.
Os habitantes de Las Cuevas consideram que os dois homens foram sequestrados quando voltavam para casa, e o barco teria sido atacado. A mãe de Joseph disse à AFP que seu filho estava na Venezuela havia três meses e rejeitou as acusações de narcotráfico.
“Não tenho nada a dizer [a Trump]. A lei do mar é que, se você vê um barco, deve parar o barco e interceptá-lo, não apenas explodi-lo”, afirmou Lenore Burnley.
Segundo o especialista em segurança de Trinidad e Tobago, Garvin Heerah, o arquipélago é um ponto de trânsito de drogas. “O país é mais do que uma simples escala. Funciona como um centro de transbordo onde se recebem, armazenam, reempacotam e preparam carregamentos a granel”, disse à AFP.
“De Trinidad, os entorpecentes circulam para o norte em direção aos Estados Unidos, para o leste, em direção à Europa e África Ocidental. Trinidad e Tobago serve como base de uma cadeia de tráfico mais ampla e bem estruturada”, declarou Heerah.
Trump confirmou que deu carta branca à CIA, a agência de espionagem com longo histórico de interferência na América Latina, para ações secretas na Venezuela, cujo objetivo final seria a queda do ditador Nicolás Maduro.
Segundo a agência de notícia Reuters, o Exército dos Estados Unidos realizou um novo ataque, nesta quinta-feira (16), contra uma embarcação suspeita de transportar drogas próxima à costa da Venezuela e, pela primeira vez, houve sobreviventes. A agência relata que as duas pessoas que sobreviveram estão sob custódia em um navio da Marinha americana, e outras duas morreram na ação.
O Pentágono não comentou a ação.