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Jeff Mills vem a SP com trio Tomorrow Comes the Harvest – 14/10/2025 – Ilustrada

Jeff Mills não tem medo da inteligência artificial. Um dos mais importantes nomes da música eletrônica, o artista se acostumou a falar com máquinas desde os anos 1990, quando liderou a segunda onda do techno de Detroit. O movimento ecoou por pistas de todo o mundo e Mills, demonstrando um controle exímio da tecnologia de produção e performance, ganhou o apelido de mago.

O artista traz de volta sua magia ao Brasil nesta semana. Dessa vez, o retorno é uma estreia. Ele vem ao país com o Tomorrow Comes The Harvest, projeto que toca junto aos músicos Jean-Phi Dary nos teclados e Prabhu Edouard nas tablas —instrumento percussivo de origem indiana. “Essa é a primeira vez que posso falar ao público brasileiro mais como eu e nem tanto como minhas máquinas”, diz Mills.

O grupo nasceu como um duo com o baterista Tony Allen, nome fundamental do afrobeat que morreu em 2020. Hoje, a três, o coletivo opera como engrenagens fluídas, algo entre a liberdade do trio de jazz e a precisão da música de pista. “Somos três engenheiros criando uma fórmula”, diz. “É uma ciência experimental, em que você só precisa colocar uma coisa em cima da outra e ver se sai algo interessante —e expandi-lo a partir desse ponto.”

Mills lidera a jornada atacando percussões clássicas da música eletrônica, como as palmas dos sintetizadores TR-909, e manipulando linhas melódicas, frases cruzadas por efeitos mais comuns na pista do que em espetáculos contemplativos. “No palco, eu toco, mas também programo as máquinas”, explica ele. “Isso me dá liberdade para voar solo, sair do esquema, e fazer coisas que pessoas ainda não viram porque acham que a música eletrônica tem de ser uma certa maneira.”

O resultado é uma viagem através de uma paisagem sonora dinâmica e contínua, uma aventura com ares de ficção científica, entre átomos e espaço sideral. “Criar uma atmosfera cósmica é a fundação do projeto, é a ideia de que estamos lidando com algo maior, e que somos todos parte de uma equação”, reflete o artista, que também sabe a hora de deixar o controle da nave na mão dos camaradas. “Se a gente quer chegar a algum lugar, a gente tem de achar conexões entre si e deixar o ego de lado.”

Ao contrário do que imprime a atual imagem do DJ —individualizada no delírio popstar—, Mills sempre trabalhou como parte de um coletivo humano-máquina. Nos anos 1990, ele se uniu aos amigos Robert Hood e Mike Banks para criar o Underground Resistance. O grupo foi fundamental para a música eletrônica ao explorar linhas de som tanto industriais quanto jazzísticas no techno—elementos que até hoje orientam as pistas, do hard techno ao deep house.

“Quando o Mike e eu começamos a fazer música, a gente explorou aquilo como a gente queria e só depois vinham as perguntas se tal coisa era aceita ou não”, diz ele. “Eram os anos 1990 e havia uma cultura pós-rave, cheia de brilho e espetáculo, então um som mais techno jazz não era algo que as pessoas buscavam, e mesmo assim a gente fez isso —o que foi uma boa decisão.”

Nos anos seguintes, Mills alargou as fronteiras da música eletrônica. De um lado, acentuou sua abordagem de produtor nas pistas. Suas performances viraram referência de como dar alma às máquinas. Em 2004, fez uma turnê em que tocava techno puro com três toca-discos —uma proeza técnica. Dez anos depois, revisitou a ideia com apenas um sequenciador.

No fim do ano, o artista rememora outro desses momentos em turnê comemorativa de sua performance no Liquidroom —clube japonês em que entregou um set de alta destreza e repertório, como uma performance rara de um jazzista. “Eu sabia que aquela noite ia ser gravada, fiz coisas que não tinha feito até então, toquei de forma a conseguir o melhor do equipamento, eu estava tentando dar exemplos do que era possível fazer com a música eletrônica”, lembra ele.

Nos últimos anos, Mill também aproximou as pistas das salas de concerto. Em uma mesma temporada se tornou possível vê-lo tocando em grandes clubes, como o Berghain, em Berlim, e festivais refinados, como o Jazz à la Villette, em Paris. Hoje, é também um dos pioneiros da música eletrônica que segue no topo da cena, tal como Kerri Chandler, Kevin Saunderson, entre outros.

“Quanto mais eu avanço, mais interessante ficam as coisas”, conta ele. “Existe uma noção de que quando você é jovem você faz coisas incríveis, e acho que é o oposto. Acho que quanto mais experiências você acumula, mais empolgante ficam as coisas. A quantidade de coisas a que você pode se referir, a quantidade de opções, enfim, é isso que torna a performance interessante.”

Com tanta experiência na música dos homens e das máquinas, Mills vê a inteligência artificial como parte de uma evolução —animal e técnica. “Inventamos a roda porque queríamos chegar mais longe, e essa busca vai continuar para sempre”, imagina ele. “A gente já teve medo da internet, da virada do milênio. Mas, para mim, é fácil imaginar que um dia eu talvez possa tocar com Miles Davis no trompete e o Keith Jarret no piano usando inteligência artificial. Isso me deixa empolgado.”

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