Em janeiro do ano 2000, quando estreou no Armazém 14, “A Máquina” levou para o Recife críticos de teatro, jornalistas especializados e artistas famosos para assistir ao espetáculo baseado no romance de Adriana Falcão e dirigido por João Falcão. Foi um acontecimento na cidade e o burburinho levou a peça a ser apresentada em outras capitais.
Além da criatividade da encenação, o espetáculo é famoso por ter revelado os então jovens atores Wagner Moura, Lázaro Ramos, Vladimir Brichta e Gustavo Falcão.
O sucesso foi tanto que eles logo engataram outros trabalhos, inclusive na TV, e não conseguiram prolongar por muito tempo a turnê. Muita gente ouviu falar de “A Máquina”, sabe da importância da montagem para a dramaturgia brasileira, mas não conseguiu assistir nos palcos a história de Antônio e Karina na fictícia cidade de Nordestina.
A chance de ver a lendária peça chega agora, como parte da celebração dos 25 anos da obra teatral. A nova montagem estreia nesta quinta-feira (9), no Teatroiquè, em São Paulo, e deve circular pelo país a partir de 2026.
No enredo, o jovem Antônio decide mudar o seu destino para impedir a partida da amada Karina. Para isso, doido de amor, viaja no tempo 25 anos em direção ao futuro para trazer o mundo até sua pequena e pacata cidade.
O diretor e os atores do primeiro espetáculo chegaram a cogitar a encenação com o elenco original —além dos quatro, a peça contava com Karina Falcão, irmã de Gustavo e sobrinha de João.
As agendas cheias e a passagem do tempo dificultaram a concretização da ideia, porém, a engrenagem se moveu e a história encontrou um novo grupo de jovens artistas para subir ao palco giratório do espetáculo.
A nova encenação é protagonizada pelo coletivo Ocutá (“O Avesso da Pele”), formado pelos atores Alexandre Ammano, 27, Bruno Rocha, 30, Marcos Oli, 29, e Vitor Britto, 29. Karina é interpretada por Agnes Brichta, 27, filha de Vladimir Brichta.
O elenco atual ganhou as bênçãos do antigo, por meio de um encontro cheio de expectativas e emoções entre os velhos Antônios e os novos.
“Foi uma passada de bastão”, resume Agnes, atriz que tem o texto de “A Máquina” como referência em sua formação artística, apesar de não lembrar do pai em cena, por ser muito pequena na época.
Nas recordações dela, no entanto, estão conversas sobre a peça e o desejo de interpretar Karina, agora realizado. Uma conquista celebrada em família e que Agnes ainda custa a acreditar ser real.
A atriz conta que todo mundo que a conhece já a viu lendo trechos da peça. É uma obsessão, ela admite.
Enquanto apresentavam “O Avesso da Pele”, peça baseada no livro de Jeferson Tenório, os atores do Ocutá começaram a pesquisar outros textos e Vitor Britto, fã de João Falcão, lembrou de “A Máquina”. Leu o livro, ficou encantado com o universo lúdico e, a partir disso, o coletivo começou os primeiros passos para a remontagem.
“Foi uma conversa gradativa”, conta o ator, lembrando que o contato começou com Adriana Falcão, chegou ao produtor Clayton Marques e, depois, a João Falcão. Na casa do diretor, em São Paulo, o grupo recebeu a informação de que poderia assumir o trabalho.
“É um sonho concretizado. Foi uma confluência de fatores que possibilitou estarmos vivendo isso nesse momento”, diz o ator.
A produção encontrou no Teatro Teatroiquè, um antigo estúdio de cinema no Butantã, o espaço ideal para os 600 kg de cenário, com a estrutura do palco giratório que representa a passagem do tempo.
“Chegou a hora de mais gente conhecer Nordestina e a história de Antônio e Karina”, diz o diretor. Para ele, “A Máquina” foi mais falada do que vista no teatro.
Além da agenda lotada dos atores da primeira montagem, a estrutura cenográfica obrigava o público das sessões a ser reduzido.
A trama de Antônio e Karina virou filme (2005), com Paulo Autran e Mariana Ximenes no elenco, além dos quatro atores originais.
“‘A Máquina’ foi um acontecimento extraordinário na minha vida”, diz Wagner Moura. “Fez parte de um momento de transformação”, completa Lázaro Ramos. “O ator que eu sou é por causa de ‘A Máquina'”, diz Vladimir Brichta.
Na fase de preparação, os atores do coletivo Ocutá e Agnes viveram, nos últimos meses, uma rotina intensa de leituras, ensaios e preparação física.
Ritmo intenso e musicalidade cênica são marcas do espetáculo na roda que não para de girar.