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Portugal: Autoridades negociam reciprocidade a brasileiros – 05/10/2025 – Mundo

Autoridades de Brasília estiveram nesta semana em Lisboa com representantes do alto escalão do Executivo de Portugal para manifestar preocupação e negociar melhorias na situação dos brasileiros que vivem no país após o governo local endurecer as regras migratórias.

Uma comitiva liderada pelo secretário nacional de Justiça, Jean Uema, e pela embaixadora Márcia Loureiro, chefe da secretaria de assuntos consulares do Itamaraty, reuniu-se com um grupo de mais de dez autoridades portuguesas.

Os brasileiros viajaram com a expectativa anunciada de que o Parlamento de Portugal aprovaria a qualquer momento o endurecimento da lei migratória que afeta diretamente a comunidade brasileira. A reunião com os representantes lusos ocorreu justo quando era votada a matéria —aprovada com maioria expressiva, de 160 votos contra 70, em uma aliança do centro governista com a ultradireita.

Assim, os representantes de Brasília pediram que haja diferenciação para o caso dos brasileiros, sob o argumento de que é preciso haver reciprocidade. O argumento é que imigrantes portugueses no Brasil gozam de amplos direitos, entre eles poder adquirir nacionalidade após apenas um ano como residentes e com facilidade obter autorização para trabalhar no país.

São justamente esses alguns dos pontos que estão sendo agora alterados por Lisboa. O projeto aprovado pelos legisladores prevê que os brasileiros (assim como todas as demais nacionalidades) não podem mais entrar como turistas no país, sem visto, para então pedir residência. Em vez disso, terão que fazer essa solicitação nos consulados, antes de viajarem.

A nova regra também dificulta a chamada reunião familiar —quando um imigrante residente no país tenta levar a família, como filhos e cônjuge, para morar com ele. E ainda complica o visto de trabalho, que agora só deverá ser dado a profissionais “com altas qualificações”.

Um projeto de lei paralelo a este, e já aprovado, também dificulta a concessão da nacionalidade portuguesa para os imigrantes. A comunidade brasileira em Portugal é a maior no exterior, atrás apenas da presente nos Estados Unidos.

O secretário de Justiça, Jean Uema, diz que os malefícios de uma política migratória restritiva como essa já podem ser observados mesmo antes de as mudanças entrarem em vigor, dado que ainda precisam ser sancionadas pelo presidente português. Ele afirma temer a xenofobia.

“Devido a uma história compartilhada que começa com a colonização, nossa relação com Portugal é secular. Hoje são mais brasileiros emigrando para lá, mas pode ser que em um determinado momento esse fluxo se inverta”, diz Uema à Folha, “e não queremos que isso se transforme em uma batalha xenófoba”.

“É importante que essas alterações na lei não provoquem estigmatização dos brasileiros que lá vivem, pagando impostos e contribuindo com a sociedade”, acrescenta.

Os brasileiros também manifestaram preocupação com a enorme demanda represada, na casa de centenas de milhares, de pedidos de residência de brasileiros que já estão morando em Portugal. Segundo as autoridades, Lisboa se comprometeu a analisá-los até o final deste ano.

A embaixadora Márcia Loureiro explica que a comitiva pleiteou que Portugal adote uma definição ampla para o novo conceito de “trabalhadores altamente qualificados”, uma “que não se restrinja a profissionais de nível superior e atenda, inclusive, às necessidades do próprio mercado português”.

A diplomata se refere ao fato de que grande parte da mão de obra necessária em Portugal é em setores de serviços, muito atrelados ao turismo, como hotelaria; ou mesmo trabalho em pesca, fazendas e cuidados de idosos. São postos-chave para os brasileiros e de alta importância para a dinâmica econômica de Portugal, mas que, ao menos em teoria, não entrariam nessa chamada “alta qualificação”, cuja lista de áreas ainda não foi divulgada pelas autoridades.

Ela também diz que pela primeira vez a violência contra as mulheres brasileiras no país foi tema de debate. Mais, a delegação brasileira manifestou o temor, já presente na comunidade imigrante local, sobre como serão feitas as remoções coercitivas —leia-se deportações— de brasileiros em situação irregular.

Parte da comunidade brasileira em terras lusas tem sido dominada pelo medo de como os órgãos de Segurança de Portugal passarão a atuar com imigrantes quando a mudança da lei se concretizar, explica o professor João Carlos Jarochinski, membro do observatório da Emigração Brasileira, professor da Universidade Federal de Roraima e hoje pesquisador na Universidade de Lisboa.

“Entre a comunidade brasileira ainda não regularizada se percebe um tensionamento e medo das autoridades. Há um receio de que a autoridade migratória comece a fazer deportações, o que ainda não está claro, e ainda mais agora com a sombra do que vem acontecendo nos EUA”, relata, referindo-se a prisões e deportações de brasileiros sob o governo de Donald Trump.

“A valorização da multiculturalidade que havia em Portugal, como um traço muito marcante da lusofonia, desandou após uma campanha passiva da ultradireita”, diz Jarochinski.

O secretário Uema afirma que por ora o governo não planeja apresentar medidas retaliatórias, como complicar a migração de portugueses para o Brasil. “Não queremos prejudicar os imigrantes, os portugueses que porventura queiram ir ao Brasil, mas é um fato que precisamos avaliar essa questão e pensar na reciprocidade.”

No mesmo sentido, a embaixadora Loureiro diz que não é possível “descartar que o aumento das assimetrias, a partir da nova legislação migratória em Portugal, leve a reações na sociedade e no Congresso”.

“Mas o nosso objetivo é manter sempre o diálogo com Portugal e contribuir, por meio de nossa comunidade ali residente, com o crescimento do país”, afirma a diplomata.

A migração de brasileiros para Portugal cresceu vertiginosamente nos últimos anos. Em 2023, mais de 368 mil brasileiros tinham autorização de residência no país, um aumento de mais de 50% em relação ao ano anterior, quando eram 239 mil.

Há uma parcela, ainda que pequena, de brasileiros que emigram para o país europeu e decidem voltar —e quem acompanha o tema acredita que, agora, esse número possa crescer. Com patrocínio do governo luso, Organização Internacional das Migrações tem um programa que apoia os chamados retornados voluntários.

Os mais recentes relatórios da organização global mostram que somente neste ano, até o mês de agosto, ao menos 177 pessoas receberam apoio da organização para voltar ao Brasil e se reinserir social e economicamente na sociedade brasileira. O sonho de uma nova vida do outro lado do Atlântico não se concretiza para todos.

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