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Palestino que perdeu perna em Gaza tenta recomeçar nos EUA – 05/10/2025 – Mundo

Em janeiro deste ano, durante um cessar-fogo, Muhammad decidiu visitar as ruínas de sua casa na Cidade de Gaza. Deixou Rafah, onde estava abrigado, e cruzou 30 quilômetros com os tios, primos e irmãos. Escalava os escombros à procura de algo para salvar quando pisou em uma bomba, que explodiu. Aos 16 anos, Muhammad perdeu uma perna.

A essa tragédia somou-se o fato de que os bombardeios de Israel haviam destruído quase todo o sistema de saúde em Gaza. A saída que sua mãe, Samira, encontrou foi pleitear a ajuda da ONG Heal Palestine (cure a Palestina, em inglês). Muhammad recebeu um visto humanitário e viajou em agosto para os Estados Unidos, onde por fim recebeu auxílio médico.

Muhammad foi uma das 63 crianças e adolescentes que a Heal Palestine trouxe para os EUA desde janeiro de 2024, quando começou suas operações. Ele foi também um dos últimos beneficiados. Em agosto, o governo de Donald Trump suspendeu a emissão de vistos para o tratamento médico de palestinos.

“Tivemos a sorte de poder ir para os EUA. Enquanto isso, há um número enorme de outras pessoas amputadas em Gaza“, Samira diz em entrevista à Folha. Muhammad acompanha a conversa, mas prefere não participar. A família pede que a reportagem cite só seus primeiros nomes devido à incerteza de sua situação nos EUA.

Segundo o Unicef, fundo da ONU para a infância, entre 3.000 e 4.000 crianças tiveram de amputar um ou mais membros na Faixa de Gaza. Esse território palestino —um quarto da área do município de São Paulo— é o local do mundo com mais amputações de crianças por habitante.

Samira conta que deixou a Cidade de Gaza no primeiro dia dos embates, iniciados em 7 de outubro após o atentado terrorista do Hamas contra Israel, que deixou 1.200 mortos. Refugiou-se em Gaza, em uma casa da família, de onde acompanhou a campanha militar israelense que já matou mais de 67 mil palestinos, segundo autoridades de saúde ligadas à facção, além de ter devastado todo o território.

Um relatório independente da ONU recentemente afirmou que Israel comete um genocídio em Gaza, algo que organizações e líderes internacionais —incluindo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva— têm dito há meses. Israel nega essas acusações e diz apenas se defender.

Poucos dias depois da fuga da família de Muhammad, a casa na Cidade de Gaza foi bombardeada e destruída. Eles ficaram em Rafah, no sul do território, onde se reuniram com outros parentes. “Tudo era difícil. Nem sempre tínhamos farinha para fazer pão. Às vezes não havia nada no mercado para comprar. O barulho das bombas era alto demais”, conta Samira à reportagem.

Seu marido e o filho mais velho, Abdallah, foram atingidos por disparos israelenses enquanto estavam em casa e sofreram ferimentos leves. Dois de seus sobrinhos, primos de Muhammad, morreram nos ataques. O termo que Samira usa em árabe é “viraram mártires”, que é como os palestinos costumam se referir às vítimas dos bombardeios israelenses.

Depois que Muhammad teve de amputar a perna, Samira conseguiu levá-lo para o Egito e, de lá, os dois se mudaram para o estado americano de Maryland. “É duro demais saber que meu marido e meu filho maior ainda estão em Gaza. Muito, muito duro. Mas Muhammad tem o direito de ser tratado para conseguir seguir com sua vida”, afirma. A família planeja se reunir no Egito assim que terminar esse tratamento.

Samira insiste, durante a conversa, na sensação de ter tido sorte em receber o visto —hoje, impossível para pessoas na mesma situação. Diz que foi bem recebida nos EUA pela família que a abrigou e pela comunidade que a amparou. Isso ajuda, segundo ela, a mitigar o sentimento de “ghurba” (palavra árabe que indica uma saudade de casa).

Steve Sosebee, fundador da Heal Palestine, auxilia crianças palestinas a se tratar nos EUA desde 1990, quando trabalhava em outra organização. Foram centenas de pessoas atendidas nessas décadas. “Temos um dos melhores sistemas de saúde do mundo. Se podemos tratar essas crianças aqui, não deveria haver nenhum problema. Nós não somos uma entidade política.”

A Heal Palestine ajuda não apenas com o visto e a viagem, mas também com hospedagem, alimentação, educação e tratamento psicológico. O financiamento é privado, por doações individuais, sem verba pública.

A decisão americana de não emitir mais vistos para o tratamento médico de palestinos, porém, forçou Sosebee a interromper o fluxo. A ONG busca parcerias em outros países. O fundador se diz aberto à possibilidade de trabalhar com o Brasil, mas não existem planos por ora.

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