A Universidade Harvard rejeitou categoricamente a conclusão do governo de Donald Trump de que a instituição violou a lei federal dos direitos civis, contestando o que considerou serem inúmeras imprecisões e falhas na investigação, de acordo com uma resposta extensa enviada ao governo e obtida pelo jornal The Washington Post.
A universidade afirmou que o governo dos Estados Unidos cometeu erros factuais e aplicou a lei de forma indevida durante sua investigação sobre suposto antissemitismo no campus, ignorou dezenas de mudanças feitas por Harvard para melhorar o ambiente para os judeus e não reconheceu as respostas extensas da universidade ao longo de muitos meses às solicitações de informações.
Os documentos oferecem uma visão da batalha sem precedentes entre o governo Trump e a mais antiga universidade em funcionamento dos EUA —confronto que envolveu autoridades federais lançando investigações, penalidades e ameaças contundentes, enquanto Harvard moveu dois processos judiciais em resposta.
No início de setembro, uma juíza federal concluiu que o governo violou a Constituição e leis como o Título 6º da Lei dos Direitos Civis, que proíbe a discriminação com base na raça ou nacionalidade, em suas ações contra Harvard. Ela disse que o governo havia usado acusações de antissemitismo como uma cortina de fumaça para um ataque ideológico, ordenou a restauração de mais de US$ 2 bilhões em fundos de pesquisa congelados e proibiu suspensões adicionais de financiamento.
Na terça-feira, Trump afirmou no Salão Oval que seu governo e Harvard estavam “muito perto” de chegar a um acordo que incluiria um investimento de US$ 500 milhões da universidade em escolas técnicas e outros programas, o que significaria, segundo ele, que os “pecados de Harvard estariam perdoados”.
Porta-vozes de Harvard não responderam a pedidos de comentário.
O governo afirmou que Harvard está em “violenta violação” do Título 6º, argumentando que, em alguns casos, a universidade foi deliberadamente indiferente e, em outros, “participou intencionalmente do assédio antissemita a estudantes, professores e funcionários judeus”.
Na segunda-feira (29), o Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS) iniciou uma ação para impedir Harvard de receber qualquer financiamento federal —uma manobra normalmente usada em casos de fraude. A agência acusou Harvard de permitir a discriminação generalizada contra estudantes judeus no campus e de se recusar a cumprir as solicitações do governo para mudanças.
“O Congresso conferiu às agências federais poder para buscar o cumprimento do Título 6º por meio de mecanismos formais de fiscalização, incluindo a suspensão de recursos ou a negação de assistência financeira federal futura, quando a conformidade voluntária não pode ser alcançada”, disse Paula M. Stannard, diretora do Escritório de Direitos Civis do HHS, ao anunciar que a agência estava encaminhando Harvard para processos de suspensão e exclusão.
Os porta-vozes do Departamento de Saúde e Serviços Humanos não responderam a um pedido de comentário
O Departamento de Educação anunciou duas novas ações contra Harvard em 19 de setembro, no mesmo dia em que a resposta de Harvard à conclusão do governo foi enviada.
Em dezenas de páginas detalhadas e repletas de notas de rodapé, Harvard contestou a decisão, apontando o que chamou de falhas e acusações enganosas. Entre elas:
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O governo disse que os mecanismos de Harvard para envio de queixas eram falhos, já que apenas um pequeno número de denúncias sobre segurança física foi registrado. Harvard respondeu que o número reduzido refletia a eficácia de suas medidas de segurança.
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O relatório do governo descreveu um suposto ataque direcionado a uma pessoa específica. Harvard esclareceu que se tratava de uma estudante que relatou que sua mezuzá —objeto ritual judaico— havia sido derrubada de sua porta. A polícia investigou e encontrou a mezuzá nas proximidades, sugerindo que pode simplesmente ter caído. A estudante depois declarou publicamente que sua experiência não justificava a conclusão do governo e não deveria ser usada como pretexto para destruir a universidade. Ela também destacou que ninguém do Escritório de Direitos Civis a procurou para saber o que havia ocorrido.
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Harvard também contestou uma acusação central de assédio na primeira investigação federal. O caso se baseava em uma reportagem que afirmava que estudantes da formatura da escola de medicina em 2024 usaram estolas —faixas de tecido usadas sobre a beca— com a bandeira palestina, um keffiyeh (lenço tradicional palestino) e um mapa vazio de Israel, alguns com inscrições em árabe como “Palestina” ou “Jerusalém é nossa”. Harvard disse que o relato era factualmente incorreto. Embora tal conduta possa ter ocorrido em formaturas de outras universidades, a resposta afirmou que, após revisar cerca de mil fotos e o vídeo completo da cerimônia, não encontrou ninguém usando tal estola. “Não recebemos uma única queixa de assédio de qualquer estudante judeu ou israelense”, escreveram os representantes da universidade, “nem de ninguém”.