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No Brasil e nos EUA, insatisfação cresceu abaixo do radar – 01/10/2025 – Lúcia Guimarães

O que pode haver em comum entre a multidão protestando na avenida Paulista e a multidão digital cancelando assinaturas de serviços como Disney+ e Hulu? Talvez a resposta esteja nas palavras de Howard Beale, figura central do clássico “Rede de Intrigas”: “Estou furioso e não vou mais aceitar isso,” brada o personagem vivido por Peter Finch, denunciando a ganância das grandes corporações.

Ambas as manifestações surpreenderam o establishment político e o comprometido olfato da mídia. A reação contra a PEC da Blindagem deu um susto na bandidosfera do Poder Legislativo. A reação contra a suspensão de um talk show noturno se mostrou um ponto de fervura sobre liberdades individuais que assustou até a direita engravatada de Washington.

Os brasileiros votaram com a presença em massa e a bandeira nacional, os americanos votaram com o bolso. Em poucos dias, os executivos da Disney e afiliadas que tentaram jogar o combativo Jimmy Kimmel ao mar voltaram atrás. O capitalismo, quem diria, precisa de consumidores.

A julgar pela cobertura jornalística, a resistência democrática nos dois países estava anêmica. Com a morte lenta do jornalismo local, tomar o pulso da sociedade é cada vez mais um exercício reduzido a bolhas nas capitais e maiores metrópoles.

Os brasileiros que foram às ruas eram todos “de esquerda”, como sugeriu a cobertura? Os americanos que puniram o conglomerado Disney eram socialistas de carteirinha? Claro que não. Se a avaliação depender apenas de instituições, sim, os Congressos dos dois países têm infligido derrotas aos defensores da honradez e da mais básica humanidade.

A democracia depende da integridade de instituições, mas estudos sobre movimentos de oposição a autocracias, nas últimas décadas, apontam para maior sucesso quando a organização política parte de baixo para cima.

Duas das mais visíveis campanhas políticas dos Estados Unidos no momento têm também algo em comum com o clima no Congresso Nacional que examina a justiça fiscal. Se a polarização política disparou na última década, observadores do humor eleitoral não sancionados pela usina de clichês do comentariado político detectam o que chamam de repolarização. É quando o debate reconhece a indignação do público dividido em dois polos, um eleitorado que tem mais em comum do que admitem os cínicos.

Um sinal saliente desta repolarização pode ser visto na campanha para prefeito de Nova York. O sorridente Zohran Mamdani, defensor da social-democracia, atraiu furiosos adversários bilionários que veem na sua vitória em novembro, prevista nas pesquisas, um apocalipse maoista. Mas o esmagamento real dos nova-iorquinos sob o custo de vida não é pauta de direita ou esquerda. É pauta populista beneficiada pela repolarização.

No Maine, o candidato democrata a senador Graham Platner aderiu com uma destreza retórica notável ao populismo que poderia ser chamado de “eat the rich” (devorar os ricos), uma citação talvez errônea dos argumentos do filósofo Jean-Jacques Rousseau contra a desigualdade.

Nos comícios, o cultivador de ostras parte da premissa de que a classe bilionária é o sintoma da doença social. Mas logo prossegue oferecendo uma visão rejuvenescedora de futuro que não depende de nomear inimigos. Platner lembra Barack Obama, antes de Obama capitular a Washington.


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