A magistocracia nunca pertenceu à tradição filosófica do bom juiz ou do bom jurista. Autoritária, dinástica e rentista, despreza essa linhagem nobre do Estado de Direito. Vocacionada a corromper, dificulta a construção de sistema de Justiça republicano e independente, que combate não só a mediocridade intelectual, mas a covardia política e moral.
Refém dessa hegemonia, o sistema de Justiça brasileiro se fez coautor de tragédias humanitárias como o encarceramento em massa. E ainda se dedica a aperfeiçoar técnicas de corrupção institucional, como remunerações ilegais, portas exclusivas e para parentes e lobistas, servilidade diante do poder econômico.
Os ministros Luiz Philippe Vieira de Mello e Edson Fachin são adversários da família magistocrática. O primeiro toma posse na presidência do Tribunal Superior do Trabalho nessa quinta-feira, dia 25 de setembro de 2025. O segundo toma posse na presidência do Supremo Tribunal Federal na segunda-feira seguinte, dia 29.
Pela primeira vez, as cortes superiores do país serão presididas, ao mesmo tempo, por ministros que nunca integraram o lado magistocrático da força. Completam o quadrado mágico o ministro Herman Benjamin, presidente do Superior Tribunal de Justiça desde agosto de 2024, e a ministra Maria Elizabeth Rocha, presidente do Superior Tribunal Militar desde março de 2025.
Quatro ministros cujas trajetórias ressaltam virtudes e tomadas claras de posição nas nossas divergências políticas e hermenêuticas. Sabem de que lado fica o bom juiz nos dilemas patrimonialistas. Como os mandatos são de dois anos, a coincidência dos quatro presidentes durará menos de 12 meses. Podem fazer algo transformador se, juntos, conseguirem coordenar alianças dentro e fora da Justiça.
Vieira de Mello é juiz de carreira com três décadas de experiência. Ocupou todos os cargos possíveis na Justiça trabalhista. Como conselheiro no CNJ, fez com Rosa Weber a proposta mais ousada para combater obscurantismos rentistas da magistratura. Tem sido um dos mais vocais e profundos críticos da degradação e oitocentização do direito do trabalho promovida pelo STF. Nunca foi visto em festivais de arranjinho.
Fachin redigiu os mais inteligentes votos em direitos e liberdades na jurisprudência recente. Discreto, austero, reservado, institucional e não personalista, é provavelmente o ministro com menos decisões monocráticas desde que chegou à corte.
Nunca foi visto em paloozas, rodinhas de charuto da advocacia, palestrinhas em banco. Sua posse servirá café e água. Não haverá festa nem karaokê financiados por associação de magistrados ou ingressos de advogados. Alívio para o bom gosto.
A antiostentação não é mera elegância, mas símbolo de integridade. Educam pelo exemplo, não pelo contraexemplo. Como nenhum colega de corte, fortalecem a instituição.
O “Judiciário bate novo recorde de despesas em 2024”.
De ministros notáveis esperamos debate sério e adulto sobre privilégios ilegais. Esperamos respeito à inteligência cidadã, não platitudes como “juízes precisam ganhar bem”, “agentes da soberania”, “trabalham demais”, “renunciaram à riqueza da advocacia”, “Poder que custa caro, mas vale muito”, “arrecada mais da metade do que custa”.
De ministros notáveis esperamos diálogo informado, honesto e corajoso.
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