O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nesta quarta-feira (17) que classificou a Antifa, grupo descentralizado de combate ao fascismo e ao racismo, de uma organização terrorista de grande escala. Essa é a primeira medida concreta que o republicano tomou contra a esquerda após o assassinato do influenciador trumpista Charlie Kirk no último dia 10.
“Tenho o prazer de informar aos nossos muitos patriotas americanos que estou classificando a ANTIFA, UM DESASTRE DOENTIO E PERIGOSO DA EXTREMA ESQUERDA, COMO UMA ORGANIZAÇÃO TERRORISTA DE GRANDE ESCALA. Também recomendo fortemente que aqueles que financiam a ANTIFA sejam investigados minuciosamente, de acordo com os mais altos padrões e práticas legais”, escreveu Trump em sua plataforma, a Truth Social, com as habituais letras maiúsculas.
Não está claro que consequências práticas a medida terá, uma vez que a Antifa pode mais precisamente ser descrita como um movimento do que como um grupo organizado, muitas vezes presente em protestos de rua nos EUA. Pessoas ligadas a entidades classificadas de terroristas pelo governo americano podem ser presas, e toda instituição financeira relacionada a um grupo terrorista pode ter seus bens congelados.
Durante seu primeiro mandato, em maio de 2020, Trump publicou algo semelhante sobre o grupo. À época, declarou que “designaria a Antifa como uma organização terrorista”. Naquele momento, a decisão tinha como contexto as manifestações antirracistas decorrentes da morte de George Floyd.
O então secretário de Justiça, William Barr, afirmou que, na onda dos protestos do movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), “as vozes de manifestações pacíficas e legítimas foram sequestradas por elementos radicais violentos”. Barr fez coro ao anúncio de Trump e disse que “grupos de radicais e agitadores externos exploram a situação para perseguir seus próprios interesses, violentos e extremistas”.
A declaração de Trump, no entanto, não levou a uma designação oficial de qualquer movimento doméstico como terrorista. No ano seguinte, em 2021, Trump repetiu o movimento e, no fim de seu mandato, a Casa Branca afirmou que o presidente havia assinado um memorando “para garantir que as autoridades federais avaliem as ações dos ativistas da Antifa à luz das leis federais que restringem a entrada de estrangeiros associados a organizações terroristas e estrangeiros com intenção de realizar atividades criminosas”.
A referência à legislação federal diz respeito em especial ao decreto 13224, emitido por George W. Bush em 2001 —como resposta ao atentado do 11 de Setembro— e comumente utilizado para combater o terrorismo internacional, “especificamente por meio da designação e sanção de atores estrangeiros”.
Esta foi a ordem utilizada por Trump, por exemplo, para designar grupo envolvidos com tráfico de drogas na América Latina —como o grupo venezuelano Tren de Aragua, o salvadorenho MS-13 e o mexicano cartel de Sinaloa— de organizações terroristas. O presidente classificou outras 11 organizações dessa maneira este ano.
Esse texto, no entanto, não prevê a nomeação de atores internos, sejam organizações ou indivíduos, como terroristas —somente detalha as determinações de sanções às quais empresas e cidadãos americanos podem estar sujeitos se envolvidos com os grupos estrangeiros atingidos pelo decreto.
Na última segunda (15), ao ser questionado sobre o grupo, Trump já havia declarado que considerava enquadrá-lo na classificação de “terrorista doméstico” caso tivesse respaldo de membros de seu gabinete e do Departamento de Justiça. “É algo que eu faria, sim”, afirmou. “A Antifa é terrível, existem outros grupos”. “Temos alguns grupos bastante radicais, e eles escaparam impunes de assassinatos”, acrescentou.
Desde o assassinato de Kirk, baleado no pescoço durante evento na Universidade do Vale do Utah, a base trumpista e membros do governo federal vêm falando em responsabilizar a esquerda pelo que enxergam como ameaças e retórica violenta que teria culminado na morte do influenciador.
Durante episódio especial do podcast de Charlie Kirk apresentado pelo vice-presidente J. D. Vance na segunda, o assessor sênior da Casa Branca Stephen Miller disse: “Nós vamos concentrar toda a raiva que estamos sentido dessa campanha organizada que levou ao assassinato [de Kirk] e vamos usá-la para desmontar essas redes terroristas.” As autoridades policiais americanas afirmam que o principal suspeito de matar o influenciador teria agido sozinho.
“Os protestos violentos organizados, a violência nas ruas, as campanhas organizadas de demonização e mensagens que incitam violência e as células organizadas que cometem violência —trata-se de um movimento doméstico terrorista vasto”, disse Miller, sem especificar a que incidentes se referia.
Vance também disse, na ocasião, que “não há unidade [nacional] possível com as pessoas que comemoram a morte de Charlie”.
No podcast, em entrevistas com membros do governo, Vance falou em responsabilizar “aqueles que incitam violência” e citou a Fundação Ford e a Open Society Foundations, do bilionário George Soros, como responsáveis por justificar a morte de Kirk ao financiar a revista The Nation.
Um artigo publicado no veículo na última sexta-feira (12) intitulado “O legado de Charlie Kirk não merece luto” afirma que o influenciador era “um racista, transfóbico, homofóbico e misógino inveterado que disfarçava seu ódio com versos da Bíblia porque não havia outra maneira de fingir que ele era moralmente correto. Ele tinha filhos, assim como muitas pessoas torpes”.
A retórica do governo Trump nos últimos dias levantou preocupações entre a esquerda e especialistas de que a Casa Branca usaria o assassinato de Kirk como justificativa para reprimir opositores. O ex-presidente Barack Obama disse na segunda que Trump agrava a polarização política e que os EUA vivem “um momento perigoso”. O democrata disse que o país atravessa “um ponto de inflexão”: “A violência política é o oposto do que significa ser um país democrático”.