As emissões de gases de efeito estufa continuam crescendo e a temperatura média global aumenta ano após ano, colocando o planeta em seus limites físicos. Centenas de milhares de pessoas já enfrentam consequências diretas, mas a transição energética segue freada pela ascensão do negacionismo climático e pela pressão de setores como o petrolífero. Esse movimento não apenas nega evidências científicas, como também manipula relatórios, corrompe governos, bloqueia políticas públicas e mina iniciativas financeiras de mitigação. A reeleição de Donald Trump consolidou essa tendência: os Estados Unidos, maior potência mundial, decidiram desfinanciar a luta climática, tratando-a como inexistente.
Fundos de investimento e grandes bancos, que até pouco tempo exibiam um discurso ético e ambientalista, revelaram que seus compromissos estavam subordinados à lógica do lucro. A BlackRock, maior gestora de ativos do mundo, chegou a defender uma agenda climática em 2018, quando Larry Fink declarou a urgência de enfrentar o aquecimento global. Sob esse impulso, surgiram alianças como a Climate Action 100+ e, em 2021, a Glasgow Financial Alliance for Net Zero (GFANZ), lançada por Michael Bloomberg e Mark Carney. No mesmo ano, nasceu a Aliança de Bancos para Emissões Zero (NZBA), reunindo 98 bancos de 39 países que representavam 43% dos ativos globais. Parecia o início de uma nova era para o setor financeiro.
Entretanto, a realidade se mostrou bem diferente. Pouco depois de assumir como primeiro-ministro do Canadá, Carney —antes crítico da “tragédia do horizonte”, a lógica de ignorar riscos futuros— passou a apoiar oleodutos e projetos em jazidas betuminosas, apostando em promessas de captura de carbono feitas pelas petrolíferas. A BlackRock também recuou: em sua carta anual recente, Fink incentivou a expansão da produção energética, evitou qualquer menção ao clima e criticou o “wokismo”.
Esse retrocesso afetou todo o sistema financeiro global. Diversos bancos norte-americanos e canadenses abandonaram a NZBA, enfraquecendo sua missão inicial. Denúncias revelaram ainda que muitos continuam financiando “bombas de carbono”, megaprojetos fósseis com potencial de emitir mais de uma gigatonelada de CO₂. A GFANZ perdeu membros de peso como JPMorgan, Morgan Stanley, Bank of America e HSBC, o que obrigou a flexibilizar regras e buscar apoio de bancos multilaterais. A Climate Action 100+ também sofreu baixas, mostrando como a pressão política e econômica corrói compromissos ambientais.
Do lado dos governos, a situação não é melhor. A promessa feita em 2009 de mobilizar US$ 100 bilhões anuais até 2020 nunca se concretizou. Em 2021, após a pandemia, o compromisso foi renovado; em 2024, na COP29, ampliou-se a meta para US$300 bilhões anuais. Mais recentemente, a Conferência de Sevilha anunciou novas medidas ligadas à dívida soberana e à sustentabilidade. Porém, a retirada dos Estados Unidos das iniciativas multilaterais minou as expectativas. Mesmo que os compromissos atuais se cumpram, ainda serão insuficientes frente às necessidades urgentes dos países em desenvolvimento.
A contradição é evidente: as nações mais pobres, que menos contribuíram para a acumulação histórica de gases de efeito estufa, são justamente as mais afetadas e também as mais endividadas. Para elas, os fundos prometidos não chegam, ou chegam atrelados a condições que perpetuam a dependência de combustíveis fósseis. Direcionar financiamento a setores petrolíferos não apenas amplia riscos financeiros, como compromete processos de mitigação climática.
Assim, a fotografia atual é clara: enquanto o planeta ultrapassa limites ecológicos e sociais, bancos e fundos de investimento recuam de compromissos climáticos, governos desfinanciam políticas e o negacionismo ganha força. As promessas não cumpridas, o abandono do multilateralismo e a captura do discurso ambiental pelo interesse econômico revelam uma realidade dura: até agora, a lógica do poder financeiro tem prevalecido sobre a urgência planetária.
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