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A guerra no Sudão não comove o mundo – 21/09/2025 – Bianca Santana

Se eu te pedir para pensar rapidamente em uma crise humanitária de grandes proporções, neste 2025, dificilmente você vai começar por um país africano.

Hospitais bombardeados. Crianças morrendo de doenças evitáveis, mulheres e meninas vítimas de violência sexual, comunidades inteiras sem acesso à água potável e à eletricidade. O cotidiano de milhões de pessoas atravessado por uma brutalidade silenciosa.

Nada de cessar-fogo, apesar das resoluções da ONU. Nem corredores humanitários, porque os próprios grupos armados bloqueiam a entrada de suprimentos básicos. O resultado é uma população encurralada, sem proteção nem atenção internacional.

No Sudão, mais de 13 milhões de pessoas, 1 a cada 5, estão deslocadas dentro do próprio país. Segundo o Acnur (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados), metade desse grupo é formado por crianças, milhares delas desacompanhadas de suas famílias.

A ONU aponta que 50 milhões de pessoas estão em situação de insegurança alimentar aguda. Em 15 de abril de 2025, a própria página das Nações Unidas publicou: “Um grupo de relatores da ONU afirma que a crise de fome extrema enfrentada pelo Sudão é a pior de todo o mundo”.

Desde abril de 2023, quando as Forças Armadas Sudanesas (SAF) e as Forças de Suporte Rápido (RSF) entraram em guerra, mais de 20 mil pessoas foram mortas. Esse número não inclui as mortes indiretas: gente que sucumbe à fome, à malária, à falta de remédios e atendimento. Foi assim que morreu minha amiga Roya Hassan, contaminada por malária durante o deslocamento, sem acesso a medicamentos. A guerra não tira vidas apenas pelas armas, mas pela destruição das condições de sobrevivência.

Apesar dos números alarmantes, o conflito continua amplamente ignorado pela comunidade internacional. Há poucas manchetes, quase nenhuma pressão política global.

O colonialismo que moldou o Sudão consolidou os militares como donos do poder político e econômico. Tanto as SAF quanto as RSF disputam recursos estratégicos, em especial o ouro. O metal financia a guerra, movimenta rotas de contrabando e alimenta redes criminosas internacionais. Uma herança autoritária e extrativista do Reino Unido, aprofundada por conflitos internos e interesses externos.

Assim como em qualquer lugar, a guerra no Sudão é também um negócio. Generais enriquecem e intermediários lucram enquanto a população amarga fome, deslocamentos e violência sistemática. A ausência de solidariedade internacional só reforça a falta de horizonte para o fim do conflito.

A diferença de cobertura da mídia e de repercussão nas redes sociais entre o Sudão e os demais conflitos em curso escancara a seletividade da nossa indignação. Não é coincidência que os corpos violentados no país africano sejam majoritariamente negros. A guerra no Sudão não é menos devastadora, mas o racismo a torna menos visível.

O silêncio diante dessa guerra é a continuidade de uma hierarquia de vidas herdada do colonialismo, em que algumas mortes mobilizam a devida comoção internacional, como deve ser, enquanto outras –não por acaso negras– permanecem relegadas à invisibilidade.


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