
IGOR GIELOW
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A proposta de cessar-fogo de 60 dias anunciada pelo presidente Donald Trump na noite de terça-feira (1º) está sendo estudada pelo Hamas e já divide o governo do premiê israelense, Binyamin Netanyahu, que voltou a ameaçar o grupo terrorista palestino de destruição.
Trump disse que Israel havia concordado com seus termos logo depois de ter afirmado que forçaria o aliado em Tel Aviv a encerrar a guerra na Faixa de Gaza, iniciada após o Hamas atacar o Estado judeu de forma inaudita em 7 de outubro de 2023. O chanceler do país, Gideon Sa’ar, disse que o país aceita a proposta.
Resta combinar com Netanyahu, que como de costume está deixando a acomodação das forças em seu gabinete ocorrer antes de se posicionar de forma definitiva. Nesta quarta-feira (2), ele sugeriu novamente o fim do Hamas.
“Não vai haver um Hamas, não haverá um Hamastão. Nós não vamos voltar a isso, está acabado”, disse. No sábado (5), ele começa uma viagem de cinco dias a Washington, onde se encontrará com Trump.
A ultradireita encarnada no ministro Itamar Ben-Gvir (Segurança Nacional) busca uma forma de barrar o acordo. Segundo relatos na imprensa israelense, seu partido propôs um bloco com a sigla de Bezalel Smotrich (Finanças), também um radical religioso, mas por ora o escritório do ministro negou a intenção. Eles comandam 13 dos 67 votos governistas no Parlamento, que tem 120 assentos e uma margem exígua de governabilidade para Netanyahu.
Já Sa’ar disse que está na hora de acabar com a guerra. “Há uma grande maioria tanto no governo quanto no público em favor das linhas gerais para soltar os reféns. Se há uma oportunidade para isso, não deve ser perdida!”, escreveu no X.
Depois, afirmou que “somos sérios na intenção de alcançar um acordo sobre reféns e um cessar-fogo”. “Nós dissemos sim às proposta do enviado especial [americano Steve] Witkoff. Há alguns sinais positivos. Não quero falar mais do que isso agora, mas nosso objetivo é começar conversas assim que possível”, completou.
Dos 255 reféns tomados pelo Hamas no 7 de Outubro, 50 estão em Gaza -28 deles já mortos, segundo estimativa de Israel. A agonia do cativeiro tornou-se um tema central da ativa sociedade civil do país e motivo de pressão constante sobre Netanyahu.
A isso se soma a catástrofe humanitária da guerra. Se a ação inicial contra o Hamas foi apoiada até por críticos de Israel, dada a barbaridade do terror aplicado pelos palestinos, a obliteração gradual de Gaza e o sofrimento civil viraram a chave há muito tempo.
Após o colapso do cessar-fogo do começo do ano, a situação ficou ainda mais grave. Netanyahu impôs um bloqueio de 11 semanas ao território, efetivamente matando pessoas de fome, e depois organizou a distribuição de comida nas mãos de uma nebulosa ONG israelo-americana.
No último mês, cerca de 500 civis foram mortos em incidentes nas filas por comida, de resto criticadas como insuficientes pela ONU. Israel investiga o que ocorreu e admitiu ter havido vítimas, mas em número menor e não por ordem superior, como haviam relatado oficiais e soldados ao jornal Haaretz na sexta (27).
O cenário drena o momento de popularidade em alta de Netanyahu após o ataque ao Irã, na guerra de 12 dias apoiada por Trump em seu momento final, com o bombardeio de centrais nucleares subterrâneas da teocracia.
O Hamas, por sua vez, está discutindo os termos de Trump por meio de seus mediadores usuais no Egito e no Qatar. Em comunicado, o grupo voltou a dizer que busca uma paz que retire o Exército de Israel de dentro da Faixa de Gaza. O americano disse na véspera que se a facção não aceitar o cessar-fogo, sofrerá mais do que nunca.
Em Gaza, a mais recente ofensiva israelense prossegue, com as autoridades locais falando em 20 mortos na noite de terça. Ao todo, mais de 56 mil palestinos já morreram na guerra, um número disputado por Israel por ser divulgado pelo Hamas e por não diferenciar civis inocentes de integrantes da organização terrorista que comanda o território desde 2007.
A proposta de Trump é de um cessar-fogo de 60 dias, com a libertação imediata de metade dos reféns em troca de prisioneiros palestinos. Ao fim do processo, todos os cativos remanescentes em Gaza seriam soltos.
Não há detalhes, contudo, sobre o que de fato trava as negociações, que é o status final do território. O Hamas não quer largar o controle, e os EUA sugerem que ele seja feito ou por uma reformada Autoridade Nacional Palestina, o ente que comanda a Cisjordânia sem autonomia, ou por uma coalizão maior de países árabes.
Na visão maximalista de Trump, isso entraria no escopo de um acordo maior de paz na região, envolvendo antigos inimigos de Israel, como Síria e Arábia Saudita. O problema maior é que cada país tem um interesse e resistência ao alto cacife momentâneo de Israel.
Já a oposição no Estado judeu apoia qualquer acordo que liberte os reféns, mas teme que Netanyahu apenas esteja protelando a guerra para continuar driblando seu julgamento por corrupção, que anda lentamente.
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